A COMUNICAÇÃO ANCESTRAL DE NEGROS NA FRONTEIRA BRASIL-GUIANA FRANCESA NOS SÉCULOS XVIII E XIX




“Antes de conhecer os outros, temos de conhecer a nós mesmo”, Oliveira Silveira.

Muitos do movimento negro não tem esse mesmo entendimento. O colonizador usou todos os termos da vivência negra de forma pejorativa que ao longo dos tempos, vem ganhando outros significados como: Malungos, Mocambo, quilombo, pelourinho, senzala, negro, fugitivo. Vale uma nota – os maiores levantes do povo negro durante o período de trabalho forçado, foram organizados nesses ambientes. Da Casa Grande à senzala, formou-se uma rede de comunicação que passava pelas amas de leite, mulheres quitandeiras, negro de ganho, os tigres, os capoeiras, as rodas de batuques, tendo como ponto final o quilombo. Resinificar o passado é preciso. Quem trabalhava na casa grande eram os negros (as) domesticadas, quase sempre elas mantinham uma relação com outro negro, seja ele capataz ou capitão do mato.

Os negros de ganho foram aqueles que na ausência do seu dono vendia o que à patroa fazia e não tinha coragem de vender. As quitandeiras juntavam dinheiro para comprar a alforria de outro irmão. Os tigres negros recolhiam as fezes e saiam pulando e cantando e, esse passava cantando pela ama de leite, pela quitandeira, pelas senzalas de pretos bravos e chegavam aos negros capoeiras que se situavam nos limites entre a cidade e o quilombo e, todo o levante “desaba sobre as cabeças dos opressores como tarrafa” e não se davam conta como isso era possível. A comunicação de nossos ancestrais foi eficiente, cabe a nós deciframos o que as rodas ritmadas pelos nossos tambores dizem.
Um exemplo Dessa comunicação de ancestralidade aconteceu na fronteira da Guiana Francesa com o Brasil em Oiapoque no século XVIII e XIX, essa fronteira é a única que conecta um pais sul-americano e um europeu. Dois territórios com mais de 600km de fronteira conjunta no entanto, existiram inúmeros conflitos que não detalharei aqui vou apenas me prender a parte que nos cabe.

O início da disputa entre franceses e portugueses pela fronteira apresentava uma comunicação entre negros escravizados, como magia se atraiam.  Os franceses constituíam a sua ocupação na região datado de 1836 que segundo o tratado de UTRECHT, numa área pertencente a Portugal. Ambos os colonizadores, tinham uma preocupação: à comunicação dos negros escravizados. Cabe lembrar que a primeira abolição da escravatura na França se deu 1792 e 1802, sendo que em 1848 aconteceu a segunda abolição da escravatura nas colônias francesas, por essa razão, as devoluções de negros fugitivos tinha de ser bem negociada, mesmo diante de um acordo firmado entre as duas coroas em 1732, o qual ajustava a devolução de fugitivos; coisa que raramente acontecia, pois haviam interesses mútuos na área (ao menos, essa briga entre franceses e portugueses valeu de alguma coisa) e lembrando que a abolição da escravatura no Brasil só aconteceu no dia 13 de maio de 1888, por tanto, contados 40 anos depois da última francesa. Tal como levantes feitos dentro dos navios negreiros, os negros dos dois lados da fronteira, criaram uma rede de comunicação de apoio mútuo, pois a resistência à escravidão foi fundamental.

Os colonizadores, temiam essa relação de negros fugidos: os franceses por temerem uma revolta da união desses negros e os portugueses por saberem que do outro lado da fronteira não teriam como recuperar os fugitivos, tentavam a todo custo acordos. Os rios foram as estradas para a fuga e só quem conhecia e conduzia a canoa nas corredeiras eram os negros. Ao longo desses rios formaram-se comunidades quilombolas os quais menciono: Cassiporé, Oiapoque, Araguari, Pedreira, Matapí; afinal, todo rio se encontra com o mar. Para servi de reforço refaço o relato da comarca de Macapá “cada um destes escravos é um piloto para aquele continente”. Como mensagens deixadas pelos ancestrais, grupos estão ao longo dos tempos estabelecendo uma comunicação através dos tambores que animam toda uma cultura negra. O tambor que toca aqui é o mesmo que toca lá como relata Marie- Françoise PINDARD em seu livro Musique Traditionalle créole e tanto o negro de lá quanto o daqui querem o direito que foi negado, - o direito de escrever a própria história. Afinal as trajetórias são parecidas: eles tiveram Pompeé e nós tivemos Zumbi grandes lideres guerreiros que conduziram o povo negro para a liberdade. 

Palavras chaves: comunicação ancestral, cultura negra, fronteira Guiana francesa
Fonte: Gomes e Queiroz – entre fronteira e limites: identidades e espaços transnacionais na Guiana Brasileira – séculos XVIII e XIX


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