A República de Counani : O homem que queria ser rei
Por Denis
Lamaison
"texto traduzido nem todas as palavras estão corretamente escritas em português".
"texto traduzido nem todas as palavras estão corretamente escritas em português".
Em
1887, o caso rendeu algumas boas páginas dos jornais parisienses…
Jules Gros, morador de Vanves na periferia de Paris, romancista
popular e membro de diversas empresas de geografia, se tornou o
presidente vitalício de Counani. Se alguns o levavam a maioria viam
nele o Vaudeville do ano. O território de Counani existe realmente,
entre o Brasil e a Guiana Francesa, e não pertence à nenhum Estado
nesse fim de século XIX.
Jules
Verne não poderia ter encontrado melhor assunto de Romance. Corrida
para o ouro, evasão, traição, espionagem, essa é a história da
República de Counani…
O
TERRITÓRIO CONTESTADO FRANCO-BRASILEIRO
Quais
são as fronteiras da Guiana Francesa? No final do século XIX, era
muito difícil encontrar a resposta para essa pergunte. Bacia
vertente do Brasil, uma região contestada existe desde o final do
século XVII e isso apesar de dezenas de tratados e convenções.
Aragouari, Cachipour, Caraparori, Ouassa, Tarturagal, os rios
fronteiras mudam de acordo com as interpretações dos textos antigos
ou com o geógrafos.
Em 1862, é o statu quo. As duas partes tendo fracassado mais uma vez na tentativa de entrar num acordo decidem que o imenso território que se estende entre o Amazonas e o Oiapoque permanecerá uma zona neutra, onde os governos francês e brasileiro, só poderiam intervir para tratar de questões de justiça referentes aos seus respectivos cidadãos. Nem estado, nem policia, essa terra de ninguém era uma dádiva para os presos em fuga, escravos fugitivos (o Brasil declara o fim da escravidão em 1888) e todos os tipos de aventureiros.
A TERRA DE COUNANI
O
explorador Henri Coudreau descobre a terra de Counani em 1883 durante
uma missão para o Ministério da marinha e das colônias no
território Contestado. Sua descrição é idílica, um clima ameno e
são onde não existe mosquito, pastos fertéis, propícios à
criação de gado. Essa terra situada na desembocadura do maior rio
do mundo, descreve ele em sua obra. Os
franceses na Amazônia, promete
relações tranquilas com o resto do globo”. Para ele, não há
lugar para dúvidas, esses cerrados estão aguardando apenas o
Europeu”. Quanto aos duzentos e poucos habitantes que vivem no
vilarejo de Counani, nascidos de uma « miscigenação tripla »
(Branco, Índio e Negro) falantes de português mas familiarizados
com o crioulo de Caiena”, eles só querem uma coisa: a cidadania
francesa! “Counani: um nome harmonioso, uma boa coisa, uma grande
ideia,
ele se entusiasma.
“Uma grande ideia”, é bem isso que pensa Paul Quartier, um dos membros da expedição Coudreau. O antigo relojoeiro suíço instalado um tempo em Caiena e depois reconvertido na prospecção aurífera, também sucumbiu ao charme de Counani. Em dezembro de 1885, ele desembarca na pequena vila com seu mentor e associado, o aventureiro borgonhês Jean-Ferréol Guigues. Eles se aliam aos dois capitães de Counani, Trajane Supriano, um ex-escravo e Nunato de Maceda (futuro sogro del Quartie). Os capitães são hostis com os brasileiros e muitas vezes eles levaram petições ao governador de Caiena para pedir em vão a anexação pela França. Dessa vez, eles foram muito mais longe.
Os capitães de Counani foram convencidos, ou pressionados? (Supriano só assinou sob a mira de revolveres, escreveria mais tarde um morador de Caiena). Seja o que for, eles assinam em julho de 1886, um manifesto pelo qual é instituída a república independente dos quais os habitantes adotam as leis e a língua francesa. Convencidos de suas ações, Guigues e Supriano vão em seguida para Caiena em uma vã tentativa de legalizar esse documento pelo prefeito de Caiena.
Guigues sabe que o a jovem república precisa legitimação. Ele confia a presidência do novo estado à Jules Gros, “jornalista oficial da Academia, membro das empresas de geografia de Paris, Rouen, Lisboa e de diversas empresas especialistas, conselheiro municipal de Vanves, etc. etc.”
JULES GROS E A GUIANA FRANCESA INDEPENDENTE
“Quando
eu passei por eles em 1883, eles me disseram: “Essa é a nossa
última tentativa. Se o governo francês não quer tratar desse
assunto alegando que documentos antigos nos declaram neutros,
indeterminados, não atribuídos. Mas tudo bem, nós nos declaramos
independentes.” parece que eles acabam de fazê-lo. Eles estão
certos!.
Aqui estão pessoas às quais vocês recusam os seus direitos, e isso porque há setenta e três anos, diplomatas, que não conheciam geografia, assinaram um tratado anfigúrico! Vocês não serão nada, digam a eles, vocês não serão nem franceses, nem brasileiros, nem Counanianos, vocês não serão nada. — Por Deus! Sejam Counanianos, meus amigos, é o direito de vocês. Hurra para Counani ! America to Americans ! ”
Henri
Coudreau, A França Equinoxial, t. 1, Estudos sobre as Guianas e a
Amazônia, 1886, p. 415.
Gros, homem estimado e quase sexagenário, parecia se a melhor opção. Ex-secretário da Empresa de Geografia comercial de Paris, redator nas diversas revistas populares, ele se beneficia de uma certa notoriedade. Como seu compatriota Jules Verne, do qual ele é contemporâneo, ele mistura alegremente vulgarização científica e literatura de aventura.
O vínculo de Jules Gros com a Guiana Francesa? Paul Gustave Franconie, o deputado eleito em 1879. Os dois compadres se encontram todas as sextas-feiras a noite no restaurante do Grand Véfour em Paris. Ao redor de uma refeição, marinheiros, comerciantes e políticos, trocam idéias sobre as questões coloniais. Dsse lobby expansionista, Franconie é o presidente e Gros o secretário. Gros conhece Coudreau e Guigues nessa época. O jornalista sedentário é subjugado por seus relatos. Ele fez com que os dois aparecessem no Le Journal des Voyages (O jornal das Viagens). A série é sobriamente intitulada: Os grandes aventureiros e as grandes aventuras. Foi nessa mesma revista que Gros escreveu pela primeira vez sobre a República Counaniense de Guigues, no dia 25 de julho de 1886.
Sobre a sua pequena história, dizem que Jules Gros teria sido informado sobre a sua nomeação por telegrama. Em maio de 1887, ele anuncia pela imprensa que ele foi nomeado presidente vitalício da nova República de Counani. Ele salienta que estando prestes a partir, ele busca colaboradores “com uma perfeita honorabilidade e providos de recursos suficientes para ajudá-lo à iniciar a exploração dessas ricas terras”. Ele atende em seu escritório em Clamart às segundas e quintas na parte da tarde.
Rapidamente, toda a imprensa começa a falar. O ano de 1887 se torna o ano Counani. É importante dizer que o presidente leva seu trabalho a sério. Guigues se torna ministro do Estado e grande chanceler, Quartier é o intendente geral do Palácio da Presidência e Louis Boisset, jornalista, é nomeado cônsul em Paris, na rua do Louvre, no. 18. Nas colunas do jornal oficial da Guiana Independente, distribuído em Paris, lê-se que a administração counaniana propõe concessões gratuitas (de cinco hectares por lar) aos colonos voluntários para a imigração. Como testemunhou um jornalista, o sucesso era certo :
“Ao
partir, o cônsul geral, nosso colaborador ficou surpreso de ver a
multidão na sala de espera e até mesmo na escada. Eram pessoas
decididas à partir para a Guiana Independente, que vinham pedir
informações. Os pedidos de emigração crescem para mais de três
mil.”
(Le Gaulois, 8 de setembro de 1887).
(Le Gaulois, 8 de setembro de 1887).
O incansável Jules Gros concebe também os brasões da República, adapta o código napoleão e funda uma ordem de cavalaria calcada na ordem da Legião de honra francesa, a ordem da Estrela. O brasão, uma cruz com quatro braços vermelha e preta, exibe em destaque o lema “Justiça e Liberdade”. O Le tout Paris o compra. Mais como lembra, de forma justa o Le Matin, em sua edição de 6 de setembro de 1887, “A estrela se dá e não se vende”.
A MORTE DE UMA ESTRELA
“Eu
não pude ocultar essas reflexões filosóficas do desolado
presidente da República de Counani: “- Eu os nomeio… Eles me
destituem. Eu os destituo em seguida. Mas como eu tinha sido
destituído, eu não podia mais destituí-los. Mas como fui eu quem
os nomeou, eles não podiam mais me destituir… Então, eu continuei
nomeado e eu podia destituí-los.”
Alfred
Copin, Revista de arte dramática musical, 1888, vol. 9, pag. 231.
O caso estoura em setembro de 1887. O Cônsul Boisset acusa S. Richard, ex-encarregado dos assuntos de Counani, de tráfico de influência e Gros de cumplicidade. Mantendo distância de seus associados, ele diz esperar que a nova colônia será fundada sob um duplo protetorado. Ele acrescenta por fim à um jornalista do Gaulois: “M. Gros tem o hábito de beber absínto como se fosse água”. Jules Gros não pode se deixar insultar impunemente. Ele elimina o consulado da Guiana Independente e despede Boisset. Apenas Guigues foi poupado. Esse último entretanto, escolhe o campo adversário. Com os membros do governo arruinado, ele por sua vez, declara Jules Gros como “indigno aos altos cargos aos quais ele teria sido nomeado”. No Jornal Oficial da Guiana Independente do dia 17 de setembro,Guigues se declara então, o único representante dos habitantes das províncias de Counani, Cachipour e Mapa. A ordem da Estrela foi extinta e os cavalheiros foram advertidos que eles poderiam ser processados por porte ilegal de condecoração.
A ruptura entre os principais nomes de Counani foi tão teatral como inesperada. Alguns dos protagonistas do caso ficaram com medo? Os meses passam, a França e o Brasil se aborrecem com esses rumores de separação. O dia 7 de setembro, a legação do Brasil em Paris deixa claro que ela não dá ao assunto de uma pretensa república “mais importância do que ele mereça” mas que o Brasil tomará as medidas necessárias para impedir qualquer modificação sobre o estatuto do Contestado. Essa declaração não chega por acaso, no dia seguinte ao anúncio da partida de Gros, Guigues e Boisset para Counani acompanhando um primeiro convoide cinquenta franceses – a maior parte agricultores (Le Matin, 6 de setembro).
“Hoje, essa república sai do domínio das lendas cômicas. O Brasil não a reconhece, mas ela existe.”, ironiza Gaston Jollivet no Le Matin. Mas Counani não tira mais risos. A declaração comum, publicada no dia 11 de setembro no Diário Oficial da República Francesa confirma :
“Atualmente,
algumas pessoas estão tentando criar uma república independente em
Counani, localidade situada no vasto território do qual a França e
o Brasil reivindicam a possessão desde o tratado de Utrecht.
Esse ação é totalmente em contradição flagrante com as reivindicações dos dois Estados (…). Nessas condições, nem o governo da República francesa, nem o da Senhora Majestade, o Imperador do Brasil, autorizariam o estabelecimento de uma pretensa república counaniana.”
Diário
Oficial da República Francesa, 11 de setembro de 1887.
A REPUBLICA NEBULOSA
“A
efêmera República de Counani só durou uma volta do relógio”
estampa Le
Correspondant do
dia 25 de outubro de 1887. Mas ninguém esperava o temperamento de
Jules Gros. Ele recusa de perder sua autoridade. Além do mais
ele tem razão. Guigues criou um novo governo para o
Tout-Paris, não há outros presidentes além do Gros. O Figaro
recorreu ao caricaturista Caran d’Ache, e duas páginas lhe foram
consagradas no “suplemento literário” de 31 de dezembro,
rebatizado para a ocasião de “Counani-Revue”. Em janeiro de
1888, Gardel propõe no Teatro La Gaîté-Rochechouart, uma revista
em dois atos: Paris em Counani. No ano seguinte, foi Charles Solo
quem rodou uma comédia intitulada: A república de Counani.
Na realidade, isso se tornou uma tragi-comédia. Jules Gros deseja voltar para sua administração. A França o impediu de embarcar em um navio francês. Mas isso não foi um obstáculo! Em fevereiro de 1888, ele se entende financeiramente com uma companhia financeira inglesa, The Guiana Syndicate Limited. Em troca de privilégios de exploração, essa última se compromete à levá-lo à Counani e a lhe fornecer capital. Guigues percebe seu interesse. Após negociações, os dois compadres se reconciliam. Em contrapartida, a companhia promete a cada um, 125.000 francos.
Três viagens para a Guiana Francesa acontecem entre maio e agosto de 1888. Guigues parte, acompanhado do representante do sindicato; Gros está no último comboio. Ele leva com ele a sua família, seu secretário e alguns partidários. Nunca mais ele veria Counani. De tempos em tempos, os Ingleses perceberam que poderiam continuar sem ele. Sua viagem termina na Guiana Inglesa. Jules Gros é repatriado na França. Nesse mesmo ano, o escritor britânico Rudyard Kipling escreveu O homem que queria ser rei.
É um Jules Gros desiludido que escreve após sua volta que o seu governo o persegue enquanto o seu objetivo era apenas de trazer ricos territórios para a França “sem que isso custasse um centavo ou a vida de um homem”. Quanto à Guigues, em um ensaio intitulado, Guiana Francesa Independente. Propostas ao governo francês – publicado em novembro de 1889 –, ele explica ter apenas pedido proteção francesa para esse vasto território “sem dono, sem governo” e isolado do mundo.
O presidente arruinado tenta – sem sucesso – buscar apoio dos investidores franceses, mas ele perdeu sua popularidade. A prisão de seu ex-secretário particular, por ladroeira, prejudicando uma empresa inglesa de emigração, não lhe traz boa reputação.
Jules
Gros falece na casa dele em 29 de julho de 1891, com 62 anos de
idade. Sua notoriedade ultrapassou as fronteiras. O New York Times de
17 de agosto de 1891 fala do desaparecimento de um grande
globe-trotter e de sua república nebulosa. Quanto ao Cronicista
Charles Formentin, ele escreveu no dia primeiro de setembro na Revue
des Conférences : “Counani
não existe mais, e o homem que tentou criar para o universo um
Estado sonhado por Platão, morreu antes de ter reinado. Jules Gros
partiu para uma viagem eterna, levando com estoque de suas
condecorações desprezadas, o projeto de uma constituição ideal
vislumbrando apenas de relance.”.
fonte:
http://www.alem-do-amazonas.com/artigo/historia-artigo/a-republica-de-counani-o-homem-que-queria-ser-rei/
Palavras chaves: Julio Gros, Cunani, Amapá, Brasil.
Palavras chaves: Julio Gros, Cunani, Amapá, Brasil.
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